2.3.05

Nostalgia

Diziam que aquela sala era o anat�mico do hospital que ocupara previamente o pr�dio da escola. Mesmo assim, era pra l� que todo mundo queria ir; os mais novos com curiosidade, os mais velhos com saudade.

Era na oitava s�rie que n�s adquir�amos o privil�gio de, uma vez por semana, durante um ano, freq�entar a salinha sem janelas no fim do corredor do subsolo. Foi com um brilho juvenil no olhar que n�s pisamos timidamente ali pela primeira vez. Fomos recepcionados pelo frio enregelante do ar-condicionado e o sorriso gentil do professor. Sou capaz de apostar que todos naquele dia ficaram meio frustrados ao descobrir que ainda n�o iam p�r a m�o na massa - a atra��o da primeira aula foi um filme do qual nem me lembro mais. Tudo bem, tudo para nos preparar para a viagem das quintas-feiras seguintes.

Das nossas sombras fizemos um mural, um rolo fotogr�fico gigante pintado com guache ao som de Dorival Caymmi. Uma caixa de sapato, mais um peda�o de raio-x, virou c�mera escura. A lata de leite com um furinho pequenininho que a gente tampava com fita isolante - e s� depois descobriu que se chamava pinhole, e era coisa famosa. A m�quina fotogr�fica do professor, pesada e delicada; o fot�metro que algu�m segurava perto do rosto do modelo - flash, iluminava-se o guarda-chuva; a equipe respons�vel por ir periodicamente ao centro da cidade, nas lojas que o mestre indicava, comprar filmes, subst�ncias e papel - toma cuidado, verifica se os pap�is t�o no saco, a caixa t� bem fechadinha? Ok, pode acender a luz.

Mas a luz s� acendia depois de feita a m�gica. Que come�ava exatamente quando a luz se apagava, e o olho se acostumava com a fraca ilumina��o vermelha improvisada com celofane. Era assim, na penumbra, que o negativo marcava secretamente o papel; que o branco ganhava tra�os, cinza, grafite, preto - j� t� bom, passa pra outra bacia. Quais eram os produtos mesmo? Revelador o primeiro; depois mais duas bacias, uma era fixador; depois a �gua, depois a mesa com toalhas estendidas onde a gente deixava as fotos quietas, secando do banho de imagem.

E tudo com o acompanhamento do querido fessor Paulo de Foto, sempre com o bom humor de quem fazia a mesma coisa h� mais de vinte anos e ainda adorava, quase sempre com tempo pra dois dedinhos de prosa no recreio ou depois da aula (que era no �ltimo tempo, antes do almo�o), raramente tendo que ralhar pra conseguir a aten��o dos adolescentes agitados que �ramos. Lembro de quando n�s fizemos duas sess�es de fotos em que cada um se fantasiava de alguma coisa (eu, de hippie; fotografei a Fernanda, de vi�va). No dia da revela��o, ele disse pra gente guardar nossas fotos num envelope e esconder por uns dez, vinte anos antes de abrir de novo. Como a gente ia se surpreender e se divertir com aquelas vers�es mais jovens, simples e livres de n�s mesmos.

N�o resisti, Paulo. Se a gente se encontrar na rua dia desses, promete que n�o me d� bronca?



(PS: Raz�o do post: decidi publicar alguns frutos das aulas de Foto no Deviant Art. O endere�o da minha galeria l� � http://prudencechan.deviantart.com.)

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